Finalmente voltei ao Brasil.
Muitos dry martinis no avião, o caos nos aeroportos – do Rio e de Paris – duas malas extraviadas (soube que estariam rumo à Istambul) e muita vontade de estar em minha cama.
No taxi, finjo estar dormindo, para evitar ter de conversar com o motorista.
Só quando desço diante de casa, descubro que esqueci as chaves da porta.
As empregadas não estão e todos os porteiros sumiram.
Me imagino passando a noite nos degraus, deitada sobre as bagagens.
Uma versão moderna da pequena vendedora de fósforos.
Morrendo de calor e de sede na calçada, com a bolsa cheia de Euros e usando o conjunto de esmeraldas Bulgari que ganhei de Donald Trump.
Lembro que minha vizinha tem uma cópia extra de minhas chaves.
Ela responde ao interfone com voz de sono e desce, abraçada ao marido. Parecem estar tão felizes. Acho que cheguei exatamente quando faziam amor.
Entro finalmente em casa e me jogo na cama. Nem acredito.
Sinto que estou excluida de uma realidade que é vital.
Talvez só o que os outros têm, seja real.
Espelho, espelho meu.
Me olhe, me toque.
Me ame.